O ilusionismo dos extremos


Senense Franco-Lusa apaixonada por Seia. Jurista. Mãe de 3 filhos. Candidata do Movimento JPNT
Na construção europeia, cada país tem a sua identidade, mas deve realizar os ideais e ideias comuns; este é um desiderato cada vez mais difícil de conseguir neste tempo de surgimento de novos partidos políticos que apresentam e querem concretizar ideais radicais e eurocéticas.
Numa crescente polarização social e política, ficamos a pensar se o último “sobressalto democrático” da segunda volta das eleições legislativas francesas do domingo passado, deixa o país a salvo de pessoas menos confiáveis afastando a extrema-direita do poder, pois as convicções democráticas da esquerda radical são poucas ou nenhumas!
Nos horizontes da memória cada povo guarda os seus traumas nacionais, como o caso da guerra colonial em Portugal. Cada país sofre de “assuntos mal resolvidos”, traumas coletivos que, por norma, esconde dos manuais de história, não se tirando proveitosamente as ilações para o futuro.
A França sofreu na pele as consequências das duas grandes guerras mundiais, na 1ª Guerra Mundial pelas perdas humanas e na 2ª Guerra Mundial pela divisão do seu território e do apoio total dado pelo Governo de Vichy e de tantos franceses colaborantes com o regime nazi. Qual terá sido o sentimento dos franceses que presenciaram as tropas alemãs a desfilar nos Campos Elísios em Paris? Foram tempos que deixaram profundas marcas no coletivo nacional.
Edgar Morin, sociólogo francês, que festeja por estes dias 103 anos de vida, disse que o tempo presente nos obriga a “uma nova frente de resistência”, numa referência à Resistência Francesa durante a Segunda Guerra Mundial e ao movimento de união das esquerdas, da Frente Popular de 1936 de Léon Blum.
As perdas humanas da Grande Guerra deixaram marcas na pirâmide demográfica nacional, mas a divisão da França aquando da Segunda Guerra Mundial deixou rastos até hoje. Afinal não houve um virar de página, as ideias radicais que pensávamos ingenuamente estar erradicadas, continuaram a existir latentes no pensamento das pessoas.
As ideias da extrema-direita de xenofobia, racismo e protecionismo, refletem os pensamentos de uma parte substancial da população que vive em França e em toda a Europa e não o contrário. Os partidos não convenceram os eleitores somente colocaram nos seus programas eleitorais, os medos e crenças de parte da sua população.
É este o mecanismo do populismo, dizer o que as pessoas gostam de ouvir, querem ouvir e afinal o que pensam verdadeiramente.
Como o refere o investigador político, Vicente Valentim, no seu livro o Fim da Vergonha em que apresenta a tese da normalização da direita radical, as ideias da extrema-direita sempre existiram só que eram silenciadas em razão da pressão social que existia contra elas.
“…o rápido do avanço da direita radical é, em grande parte, movido por pessoas já que tinham ideias de direita radical, mas que não as mostravam por temer repercussões sociais.”
O nosso mal é que só soubemos silenciar essas ideias; não as reeducamos, não as mudamos ou eliminamos da nossa vivência coletiva. A alteração das condições económicas ou difícil processo da integração europeia e o falhanço político dos partidos do arco da governação, entre tantos outros fatores que levaram ao ressurgimento e aproveitamento das ideias de direita radical.
Depois de tornados, e secas extremas, também a política europeia navega ao sabor dos ventos radicais, seria bom que se voltassem a guiar pelo farol dos princípios dos pais fundadores da Europa: o interesse comum da paz e a prosperidade dos povos.