Onde é que estavas nos 50 anos do 25 de Abril de 1974?
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A adaptação da pergunta de Baptista-Bastos (“Onde é que estavas no 25 de Abril de 1974?”, imortalizada depois pelo Herman José) impõe-se após as altamente participadas comemorações populares dos 50 anos do 25 de Abril, um pouco por todo o país.

Foram muitos muitos mil que saíram à rua para exigir a continuação e o cumprimento de Abril. Pelo menos em Lisboa, que foi onde me calhou estar no dia 25, novos e menos novos, empunhados de cravo vermelho e algumas reivindicações escritas, comemoraram o “dia inicial inteiro e limpo”, nas palavras de Sophia de Melo Breyner, que, há 50 anos, marcou profundamente a vida nacional e acabou com a noite mais escura de 48 anos de fascismo. Gritou-se alto e bom som: 25 de Abril sempre, fascismo nunca mais!

Na semana anterior, no Parlamento Europeu, por iniciativa dos deputados do PCP, também se assinalou a data com uma exposição, testemunhos e um concerto do fadista Hélder Moutinho, que terminou com a “Grândola, Vila Morena”, cantada pelas centenas de pessoas que assistiam.

Também no dia 27, milhares de pessoas – eu incluída – participaram na inauguração popular no Museu Nacional Resistência e Liberdade, na Fortaleza de Peniche, homenageando os presos políticos cujo acto de libertação fazia exactamente 50 anos.

A Revolução de Abril, esse marco maior na história de Portugal, encarnou a vontade do povo, a afirmação de liberdade, de emancipação social, de soberania e independência nacional. E dessa madrugada somos filhos, a minha geração e as seguintes! Não somos apenas filhos, netos e bisnetos; aceitamos os seus valores como legado e, se os sentimos em perigo, saímos à rua a defendê-los, como aconteceu na passada quinta-feira.

Sabemos que, no Portugal do fascismo, o 25 de Abril não foi sentido da mesma forma em todo o lado. Lisboa estava no epicentro e nas pequenas cidades, vilas e aldeias do interior do país, os ecos dessa revolução foram chegando paulatinamentemas fizeram-se sentir e, olhando para trás, as conquistas são inquestionáveis.

Com a Revolução de Abril, contrariou-se o fatalismo que reinava na exploração de gerações, que passava de pais para filhos e que se aceitava pobre e honradamente. Os filhos dos trabalhadores puderam ir à escola, puderam mesmo ir para a universidade porque Abril trouxe a escola pública para todos e a democratização do ensino.

Com a Revolução de Abril, o acesso aos cuidados de saúde passou a ser uma realidade para todos e, por exemplo, os números de mortalidade infantil baixaram drasticamente.

Com a Revolução de Abril, passou a haver um salário mínimo nacional e um Sistema Público de Segurança Social, assentenos princípios da universalidade e da solidariedade.

Com a Revolução de Abril, o que era de alguns passou a estar ao serviço de todos e os sectores estratégicos, essenciais ao desenvolvimento do país, passaram para a esfera pública.

Com a Revolução de Abril, pôs-se fim a esse odioso regime fascista de quase meio século de opressão, atraso económico, social e cultural; analfabetismo, isolamento internacional e guerra.

Com a Revolução de Abril, a igualdade entre homens e mulheres deu um passo de gigante: além da universalidade do voto, as medidas revolucionárias na área do trabalho, da segurança social, do direito da família, a criação de equipamentos sociais e de infraestruturas básicas, o alargamento e o reforço dos serviços públicos, tiveramrepercussões imediatas na vida das mulheres.

Com a Revolução de Abril, brotou a Constituição da República Portuguesa, essa Lei fundamental do país que é um manual de progresso e faz parte das nossas vidas, da vida de todos e cada um de nós, nos mais variados planos da nossa existência: liberdade de expressão, direitos de participação e manifestação, direito ao trabalho, a salários e horários justos, à saúde, ao ensino, à segurança social, à justiça, à habitação, à criação e fruição culturais, à liberdade sindical, o direito a fazer greve, à contratação colectiva, à igualdade no trabalho, na família, na sociedade, a direitos novos das crianças, das pessoas com deficiência.

Bem sei que muitas das conquistas a que me referi ainda agora foram sofrendo ataques e podem estar em causa. Mais ainda num contexto em que as forças conservadoras, reaccionárias e retrógradas ganharam espaço na Assembleia da República. Mas as sementes de Abril que foram lançadas há 50 anos continuam vivas e cresceram nas ruas aquando das comemorações dos 50 anos do 25 de Abril.

Continuemos a mobilizar-nos e a lutar pelo que falta para cumprir Abril e para impedir retrocessos nas conquistas alcançadas: o direito ao trabalho com direitos e à conciliação entre a vida pessoal, familiar e profissional; o investimento e reforço dos serviços públicos (de saúde e educação mas também uma rede pública de equipamentos sociais, nomeadamente de creches e de lares); o direito à habitação; o direito à igualdade; a defesa da soberania nacional e ao desenvolvimento, a defesa intransigente da paz e da solidariedade e cooperação entre os povos.

Abril é mais futuro! Abril é do povo e faz falta ao povo! Em Abril, saiu à rua e, em Maio, sairá de novo!

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