Presidente da Câmara de Seia critica combate aos incêndios “à beira da estrada”
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O presidente da Câmara Municipal de Seia, Luciano Ribeiro, criticou duramente a atual estratégia nacional de combate aos incêndios rurais, que considera excessivamente centrada na proteção de pessoas e habitações, em detrimento da floresta e de outros ativos do território.

Durante a sessão da Assembleia Municipal realizada ontem, o autarca lamentou que se tenha instalado, a nível nacional, uma cultura que considera que “floresta, pomares, plantações do que quer que seja ou montes de giestas e silvas, é tudo mato”.

“Desde que se salvaguardem as aldeias, e aqui à beira da estrada, tudo o resto é para arder. E eu não posso concordar com isso. Porque aquilo está a arder, deixámos lá as pessoas mas deixámo-las sem meios de subsistência. Salvámo-las daquele dia, daquele drama. E o resto da vida?”, questionou.

Luciano Ribeiro reconheceu que ninguém deseja colocar bombeiros ou populares em risco. No entanto, alertou que restringir o combate à proteção imediata das povoações e aos bens das pessoas, “desvaloriza-se outra construção humana, que é a floresta”.

O autarca destacou ainda os investimentos significativos realizados ao longo dos anos por Comissões de Baldios, particulares, empresas, o próprio Município e o Estado, nomeadamente em plantações, construção de mosaicos florestais e criação de faixas de contenção. “Criaram-se oportunidades de combate. E depois ninguém as aproveita”, lamentou.

Exemplo prático e críticas à atuação no terreno

Luciano Ribeiro disse que houve situações em que isso não era possível, dando como exemplo o caso das Pedras Lavradas, onde uma língua de fogo galgou uma faixa de 200 metros de proteção às torres eólicas, fazendo com que as chamas alastrassem ao distrito de Castelo Branco.

Contudo, foi no monte do Gondufo, ao terceiro dia de incêndio, que o autarca sentiu maior frustração. “Tínhamos uma faixa limpa, com fogo controlado feito no inverno, 200 metros limpos junto às eólicas, e mesmo assim vimos o fogo arrancar com tal intensidade que era impossível alguém se poder pôr à frente”.

A situação acabou por obrigar os habitantes da aldeia de Balocas a refugiarem-se no abrigo da coletividade, perante aquilo que descreveu como uma “chuva de fogo”.

Luciano Ribeiro questiona por que motivo não foram aproveitadas essas “oportunidades de combate” em zonas onde as condições o permitiam, e manifestou indignação por ver equipas de bombeiros “à espera à beira da estrada” enquanto o fogo avançava lateralmente com pouca intensidade.

Apesar de afirmar que transmitiu todas as preocupações ao comandante responsável, recebeu como resposta que estava a ser feito “o melhor possível com os meios disponíveis”, num período em que vários incêndios deflagravam em simultâneo por todo o país.

Impactos prolongados e apoio às populações

O incêndio que se prolongou por 12 dias percorreu vales e aldeias do sul do concelho, provocando, segundo o autarca, “um enorme desgaste nas populações, nas equipas de combate, nos recursos materiais e também na própria Câmara Municipal”, que esteve permanentemente no terreno.

A autarquia teve de implementar medidas de apoio ainda com o fogo ativo, nomeadamente o levantamento de prejuízos em habitações, edifícios e empresas, e a mobilização de equipas para prestar apoio psicossocial e distribuir alimentos para a pecuária e apicultura.

Embora os danos em habitações tenham sido registados sobretudo em segundas residências, Luciano Ribeiro destacou as perdas económicas significativas, em especial no setor do turismo, onde os cancelamentos chegaram a atingir quase 100%. “Um dano enorme e, até agora, sem qualquer medida de apoio”, alertou, referindo que já comunicou essa preocupação ao Governo e ao Turismo do Centro.

Também a floresta sofreu “graves prejuízos económicos e ambientais”, com investimentos comprometidos por completo.

Estabilização de emergência e apoio a candidaturas

O autarca informou que já estão no terreno equipas a executar ações de estabilização de emergência para prevenir danos causados pelas chuvas, especialmente junto a povoações e estradas municipais.

Após um primeiro levantamento de prejuízos feito por técnicos da Câmara e juntas de freguesia, decorrem agora reuniões com os lesados para auxiliar na submissão das candidaturas aos apoios estatais.

Luciano Ribeiro espera que “em poucas semanas” todas as candidaturas das freguesias do sul do concelho estejam concluídas, seguindo-se as relativas ao incêndio de Pinhanços. Manifestou ainda esperança de que os danos provocados pelo incêndio de Corgas, Sandomil – cujo levantamento ainda está em curso – sejam incluídos na Resolução do Conselho de Ministros de agosto.

Assembleia aprova medidas excecionais de apoio à reconstrução

Na mesma reunião, a Assembleia Municipal de Seia aprovou por unanimidade um pacote de medidas excecionais para acelerar a reconstrução e apoiar a recuperação das populações e empresas afetadas pelos incêndios de julho e agosto.

Entre as medidas aprovadas estão a tramitação simplificada dos processos para obras de reconstrução ou alteração, com comunicação prévia e dispensa de várias formalidades, reduzindo significativamente os prazos de apreciação dos processos.

Também a isenção total de taxas administrativas e de urbanização para pedidos de licenciamento de obras de reconstrução, reparação ou construção nova de edifícios afetados; e a isenção de IMI por três anos para prédios urbanos de habitação ou atividades económicas danificados pelos incêndios e que sejam reconstruídos, obteve o voto favorável da Assembleia.

Estas medidas abrangem as freguesias mais afetadas: Alvoco da Serra, Loriga, Pinhanços, Santa Comba, Teixeira, Tourais e Lajes, e Vide e Cabeça.

O fogo que teve início no Piódão, em Arganil (distrito de Coimbra), estendeu-se ao concelho de Seia (distrito da Guarda), devastando 8.700 hectares nas freguesias de Vide e Cabeça, Teixeira, Alvoco da Serra e Loriga. O incêndio afetou ainda os concelhos de Oliveira do Hospital e Pampilhosa da Serra (Coimbra), além de Castelo Branco, Covilhã e Fundão (distrito de Castelo Branco).

Já o incêndio em Pinhanços, no final de julho, atingiu também vastas áreas de pinhal e mato nas freguesias de Santa Comba e Tourais e Lajes. O fogo iniciado em Sandomil alastrou a Torroselo e Folhadosa, Carragozela e Várzea de Meruge, Vila Cova à Coelheira, São Romão, Sazes da Beira e Valezim.

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